Medicina pede socorro: número de cursos aumenta mas formação de médicos perde qualidade
A cada ano, dezenas de milhares de médicos recém formados entram no mercado da saúde no Brasil. Um mercado já saturado de médicos oriundos de faculdades pouco preocupadas com a qualidade desses profissionais, mas atentas à sua capacidade de honrar com mensalidades que passam de 10, 12, 19 mil reais. O Brasil é hoje o segundo país do mundo em quantidade de escolas de Medicina, atrás apenas da Índia, que tem população quase sete vezes maior do que a nossa.
Isso significa que temos a segunda melhor saúde pública do mundo? Como é a distribuição desses profissionais entre capitais e interior? E a qualidade de todos esses novos médicos que se formam? Como os planos de saúde, por mais caros que sejam, pagam a esses profissionais? E como você se sente, sendo atendido por meros 5 minutos, sem receber sequer um olhar do médico à sua frente, ansioso por atender muitos pacientes e recuperar as fortunas pagas às faculdades? Um ciclo que se repete, observado de perto pelo “Mercado da Educação”, este sim, em plena saúde.
Nem precisam de pacientes
O médico pneumologista Dr. Francisco Hora, Coordenador do Laboratório do Sono do Hospital Português, denunciou nesta semana, na Rádio Metropole, os números alarmantes deste cenário. A baixa qualificação dos profissionais, a inexistência de uma carreira de estado, a uberização da Medicina no Brasil. Ele relata que, numa conversa com um de seus pacientes, dono de uma escola de Medicina, perguntou em que hospital seus alunos estariam sendo treinados. A resposta foi elucidativa: “nossos laboratórios de robótica são perfeitos, muito bem avaliados. E se precisar de pacientes, os professores que resolvam”. Instigados pelo alerta do Dr. Chico Hora, decidimos mergulhar no assunto.
14 anos de formação
“Um médico hoje não se forma com menos de 14 anos”, afirma Dr. Chico Hora, acrescentando que essa formação não acaba depois do ambiente acadêmico, mas ressaltando que essa oportunidade é apenas para aqueles que têm um suporte familiar que os permita investir em conhecimento. Com a banalização do surgimento de novas escolas, produz-se “mais mão de obra desqualificada para um mercado ávido por esta situação”.
389 escolas no Brasil
Mais de 250 mil novos médicos entraram no mercado de trabalho no Brasil de 2010 pra cá. Seria de se imaginar que, com tantos profissionais atuando no país, teríamos uma distribuição mais equilibrada entre capitais e interior. Não é verdade. O próprio Dr. Chico alerta para a inexistência de uma carreira médica de Estado, como acontece com jovens promotores e juízes, por exemplo. Quando decidem atuar em cidades pequenas, estes sabem que estão construindo uma carreira de Estado com ascensão na profissão, diferente dos médicos. “Quando me formei, havia uma carreira de médico”, diz Dr. Chico. “Eu fui médico do Estado e assisti a este desmonte da carreira”. Muitos dos que decidem ir acabam entrando para a política, por se tornarem fundamentais na vida dessas comunidades. Também não há um incentivo para programas como o de Saúde da Família, fundamental para a prevenção de doenças em lugares remotos.
Como sempre, a desigualdade
Se a média nacional é de 2,6 de médicos por mil habitantes, as diferenças regionais chamam a atenção. Enquanto na região Norte há apenas 1,45 médico por mil habitantes e no Nordeste a taxa é de 1,93, no Sudeste existem 3,39 médicos por mil habitantes (Centro-Oeste 3,10 e no Sul, 2,95). Trocando em miúdos: conseguir ser atendido por um médico na parte de cima do país é mais difícil, mais demorado, doenças se agravam, pessoas morrem.
Desigualdade II
Alguns médicos no Brasil chegam a cobrar mais de 2 mil reais por uma consulta e têm filas de espera. Mas estamos falando de um grupo muitíssimo seleto de médicos e pacientes, que nem de longe representam a maioria. Do outro lado, médicos que atendem por planos de saúde chegam a receber entre 30 e 60 reais por consulta. No SUS, um atendimento ambulatorial rende 10 reais ao médico, mas se ele precisar tratar um AVC num paciente, poderá ter que dividir uma diária de R$ 9,20 com outro colega por, no máximo, sete dias.
Estudar em Oxford é mais barato
A Universidade de Oxford abriga a melhor escola de Medicina do mundo, segundo o Times Higher Education 2023. O custo anual de uma formação por lá é de 34 mil libras por ano, o equivalente a uma mensalidade de 18 mil reais por mês. Conseguir uma vaga lá, no entanto, é muito mais difícil, e o currículo do médico terá outra relevância. Para ingressar, o interessado precisa escrever uma carta de motivação que justifique merecer estudar na mais antiga universidade em língua inglesa (Oxford foi fundada no século XI, em 1090), além de uma série de outras exigências que medirão seu lugar na universidade que formou alunos como o inventor da internet, Tim Berners Lee, o astrofísico Stephen Hawking e o escritor Lewis Carroll, autor de Alice no País das Maravilhas.
Nos EUA ensino médio não basta
Em países como Estados Unidos e Canadá você precisa ser bacharel em outra área antes de ingressar num curso de Medicina. Ou seja, a Medicina é oferecida como um Mestrado. Lá não se sai do ensino médio direto para a Universidade de Medicina, diferente de países como o Brasil, que admitem candidatos bem mais jovens. Falando nisso, uma projeção recente da Associação Médica Brasileira prevê que, em 2035, os médicos brasileiros com idades entre 22 e 45 anos serão mais de 85%. Cada vez mais jovens, formados em faculdades que se preocupam menos com aprimoramento e mais com enriquecimento.
Planos mais caros
“Médicos mal formados são danosos ao sistema”, diz Dr. Raymundo Paraná, médico, professor de Gastro-Hepatologia da Faculdade de Medicina da UFBA, em artigo publicado em jornal de circulação local. “Mostram-se inseguros na atuação cartesiana. São vorazes solicitadores de exames para compensar a insuficiência técnica”. Observe o ciclo: quanto pior a formação do médico, mais exames ele solicita; mais caros ficam os planos; mais pacientes no SUS; mais difícil o acesso.
Chegou até você? Pois é. O número de médicos formados a cada ano no Brasil e a baixa qualidade destes profissionais pioram um problema enfrentado pelo país: uma saúde cara, pouco resolutiva e de difícil acesso. Quem diria. A explosão das escolas médicas acabou gerando um problema de saúde pública.
Reportagem publicada originalmente no Jornal Metropole em 11 de maio de 2023
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