O bom conselho de Fernando Pessoa
Por ter sido inúmeras vezes repetida por escritores, pessoas comuns, jornalistas, políticos, professores e ter estado presente em panfletos, “slogans” e murais de escolas e de faculdades, a popularizada frase do escritor e poeta português Fernando Pessoa (1888-1935), aquela que reza: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”, traz mais do que somente um dito falado em momentos estratégicos, a exemplo de palestras ministradas por palestrantes motivacionais que lembram certos pastores evangélicos ou padres da
renovação carismática.
“Tudo vale a pena se a alma não é pequena” está incluída no segundo verso do canto 10 da segundaparte cujo título é “Mar Português”, da grandiosa obra do poeta e escritor lisboeta que foi um dos principais nomes do modernismo literário de Portugal. “Mensagem” é uma exaltação ao passado português para servir de inspiração para o seu presente, mas é também uma espécie de motivação para quem instui desbravar o desconhecido, principalmente em viagens.
Isto mesmo cara leitora ou caro leitor, viagens. O que se poderia entender de “Tudo vale a pena...” se não a própria grandiosidade do ser humano em querer desbravar o “horizonte”?
E este “horizonte” pode ser a representação de quaisquer viagens que realizamos, sejam elas resultantes de positivas ou negativas impressões. A ansiedade com certa pitada de medo e expectativa são ingredientes logo substituídos pela tranquilidade e satisfação.
Nas viagens nossos olhos guardam paisagens que podem se assemelhar às do lugar onde moramos, embora cada uma possua a sua peculiaridade de cores, geografia e céu.
Na estrada que percorremos, nossos olhos gravam a magnificência de tudo o que ele pode captar em poucos segundos, de maneira que aquela magnificência é formada por uma casa aqui, algumas pessoas ali, animais acolá e tudo o que desconhecíamos até então e que, provavelmente, não voltaremos a ver.
Ocorre que em muitas das viagens que fazemos uma cidade nascida como vila no século XIX oferece histórias oficiais e extraoficiais para quem quer se deliciar em conhecê-las, promovidas por alguns dos seus moradores que leram sobre elas ou que ouviram falar delas e acabam por reproduzirem-nas. De um lugar litorâneo até um local fincado no sertão “vale a pena” ouvir os diferentes sotaques que cantam as sílabas, que as deixam mais tônicas ou mais puxadas.
Desbravar o desconhecido através das viagens é degustar uma iguaria até então ignorada, é a neblina cobrir os montes e as serras depois da tímida e bela aurora, é notar pessoas andando ou correndo nas ruas e nas rodovias para queimar calorias, é conhecer sangue bom através de um tema pessoa, profissional ou acadêmico que se prolonga em um saudável bate-papo.
Assim como a “guerreira que usa o martelo” detém olhos verdes e opiniões próprias encantadores, o “conselho” de Fernando Pessoa fascina pela coragem de dizer para toda a gente que boa parte dos medos é produzida por alguns dos nossos mais de 100 bilhões de neurônios. Conhecer o novo estigmatiza inesquecíveis lembranças.
P.S.: dedico este texto para os estudantes do 1º semestre de Pedagogia da Faculdade Eugênio Gomes (FAEG), de Ipirá, seus funcionários, aos conhecidos ipiraenses e a “guerreira” Márcia Souza.
Jorge Amorim
Licenciado em história pela Universidade do Estado da Bahia, campus Santo Antonio de Jesus, e mestre em história contemporânea pela Universidade de Lisboa, Portugal. É autor do livro “Entre a Serra e a Vargem: estudo da história e das culturas de Varzedo nos séculos XIX e XX”, além de atualmente ser professor da Faculdade de Ciências Educacionais. E-mail: [email protected].