Quando não se valoriza a verdade, se acredita na ilusão: isto é Brasil

29 de maio de 2013 \\ Jorge Amorim

Sem tirar nem pôr, ao caro leitor ou a cara leitora daqui do Brasil, de Portugal, do Timor Leste, da Itália, da Espanha ou das ilhas Cabo verde que separou um tempinho do seu dia par dedicá-lo a estas nossas palavras diremos que o Brasil é um país de contrastes, literal e cabalmente falando, e você poderá tirar as suas conclusões se é ou não é após a leitura desta coluna.

Primeiro caso. Veja a cara leitora ou o caro leitor que no início da semana passada (19 e 20 de maio) algumas agências bancárias da Caixa Econômica Federal disseminadas nos Estados do Rio de Janeiro, Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará, Piauí, Maranhão, Sergipe, Rio Grande do Norte, Amazonas e Pará foram deliberadamente invadidas – não é por serem pessoas carentes que vamos usar outro termo, digamos, eufêmico. Seria hipocrisia – por pais, mães, avós e responsáveis que recebem todos os meses o benefício financeiro que pode variar de R$ 22,00 a R$ 200,00 do assistencialista programa Bolsa Família, do governo da presidenta Dilma Rousseff.

Hecatombe social? Rebeliões sociais? Saques em massa? Que nada.

Em alguns daqueles Estados o fuxico espalhado foi o de que o governo havia acrescentado um bônus do dia das mães, comemorado no Brasil no segundo domingo de maio, naquele benefício durante as datas citadas no início do parágrafo anterior. Em outros Estados, a notícia anônima sem confirmação teve em seu conteúdo a informação de que o Bolsa Família iria... acabar. Pronto, foi razão para séquitos formarem filas serpenteosas nas portas das agências.

De onde partiram os boatos? Eles estão sendo o foco de investigação da polícia federal, ainda mais depois de a presidenta Dilma Rousseff tê-los denominado de ato “criminoso” e “desumano”. A questão que nos conduz à arguição pessoal é a de vermos como aqui a presença e a dependência ao Estado são grandes e como que muita gente desconsidera a hipótese de perder o benefício do Bolsa Família, seja agora ou seja mais para a frente, apesar de o governo alardear que o programa é o “primeiro degrau” para a emancipação dos mais pobres. Estes, na maioria, talvez prefiram conservarem-se dependentes e... iludidos.

Segundo caso. Na segunda-feira, 20 de maio, o atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, proferiu em uma palestra ministrada a estudantes de direito em Brasília que o poder legislativo é dependente do poder executivo e que os partidos políticos brasileiros carecem de ideologia, afastando assim os eleitores. Mesmo que seu discurso tenha sido realizado em ambiente acadêmico, com o uso de termos rebuscados desde “mutatis mutandis” (“mudar o que deve ser mudado”) e “last but not least” (“último, mas não o menor”), a celeuma provocada por ele chegou a câmara dos deputados, ao senado e a mídia brasileira.

O insigne presidente, que meses atrás havia feito críticas férreas ao seu campo de formação/trabalho, o judiciário, ao atacar juízes que se locupletam de maneira corrupta, disse algo estranho acerca dos nossos representantes públicos? Joaquim Barbosa cometeu um ato falho aconselhando graduandos ao questionamento weberiano falando dos políticos quererem “o poder pelo poder”?

Caso ele tenha utilizado da sua verbal metralhadora giratória mais uma vez, jurista que é sabe o quão é relevante a verdade ser dita, já que temos a constitucional liberdade de expressão (ver na Constituição federal de 1988 o inciso IV do artigo 5º). A verdade incomoda aos que se sentem perseguidos por ela. A ilusão é perfeita para sedar uma maioria.