Terapia em Foco

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Daniella Sinotti
  • Os dilemas da mãe moderna em O Diabo Veste Prada

Os dilemas da mãe moderna em O Diabo Veste Prada

09 de maio de 2017 \\ Terapia em Foco

O Dia das Mães se aproxima e com ele uma enxurrada de campanhas publicitárias que reforçam o perfil da mãe perfeita, no exagero em estabelecer uma imagem padrão quase sempre inatingível, que acaba por gerar um sentimento de angústia em muitas mulheres. No filme 'O Diabo Veste Prada', alguns dos dilemas das mulheres modernas traduzem o que enfrentamos com a maternidade.
Maryl Streep vive Miranda Priestly, uma poderosa editora de moda de uma revista, de alto prestígio profissional, mas com uma vida familiar caótica. Na essência, a personagem vive o dilema das mulheres que passam pelo sofrimento de terem que renunciar ao convívio com os filhos e com a família, em nome do poder e de uma carreira bem sucedida.
Miranda tem duas filhas, com as quais não consegue estabelecer um vínculo afetivo minimamente saudável, todas as responsabilidades de mãe são delegadas a terceiros. Minha avaliação enquanto terapeuta é que uma parte da personagem morreu quando ela passou a negar algo que era de grande valor, sua maternidade. Na angústia de deixar de entrar em contato com aspectos da mãe amorosa, ela tenta suprimir a carência assumindo um perfil arrogante e frio em suas relações.
A personagem principal do filme é Andrea, vivida por Anne Hathaway, uma jornalista recém-formada em busca de uma oportunidade de trabalho. Humilhada e desprezada, ela inicialmente se recusa a adotar os padrões da moda, mas aos poucos é vencida por sua ambição e pelo glamour do ambiente de trabalho.
Percebo nessa personagem a nossa essência que se perde quando nos deparamos com uma sociedade que exige de nós algo impossível. Sufocada pelas exigências desse emprego, Andrea se enxerga vivendo um pesadelo, mas não desiste de seu sonho.
Assim encaramos a maternidade, inicialmente cheias de encantamento, mas depois angustiadas com o nível de exigências impostas. O que fazer para encarar essa jornada e impor o nosso modo de encenar esse papel é o grande desafio. Nesse momento, é importante que haja autorreflexão e um olhar interno profundo para a nossa essência e nossos sonhos.
A sabotagem e a falta de cumplicidade é outro fator que aparece no filme, sobretudo através do comportamento da 1ª assistente, Emily (Emily Blunt), que mesmo infeliz em seu trabalho, não vê perspectivas de mudança e ataca qualquer um que se aproxime. É dessa forma que agem as pessoas que insistem em apontar erros e falhas o tempo todo. Seja nas redes sociais, nos grupos da família, ou entre os amigos, há sempre alguém com o dedo em riste para criticar a forma como uma mulher se estabelece no papel de mãe. Vale lembrar que Emily é uma personagem secundária, o que já dá uma pista sobre como é preciso encarar essa situação. O "não" é uma ferramenta poderosa e que deve ser utilizada diante dos abusos.
Na relação estabelecida entre essas personagens podemos refletir sobre parte da angústia de sermos cobradas. Com a avalanche de expectativas e de conselhos vem um turbilhão. O sonho acaba se tornando parte do pesadelo de um cotidiano em que as inúmeras tarefas de uma mãe perfeita não deixam espaço para o ser completo que também é mulher, profissional, amiga e outras tantas possibilidades. E aquela mulher que sentia prazer em se arrumar e encontrar as amigas pode morrer dando lugar a uma pessoa que não enxerga sentido na vida.
Ser mãe é também viver a plenitude, é uma jornada que não tem script pronto e depende muito mais da livre escolha e dos ideais de cada uma. Em cada história de vida há uma infinidade de papeis e possibilidades, baseados nas experiências pessoais, crenças e valores.
 
Texto escrito por: Daniella Sinotti, Terapeuta Transpessoal Sistêmica e Jornalista.
MTB 1870 / CRTH-BA 01434/17