Como os estudantes avaliam as aulas remotas?

15 de dezembro de 2020 \\ Osmando Barbosa Caldas Filho

Se toda a vida humana não é mais a mesma depois da pandemia do coronavírus (COVID-19), a educação não seria o único setor a sair ileso...

Aliás, muito pelo contrário, parece àquele a sofrer as maiores consequências. Desde o mês de março, alunos estão tendo aulas de um jeito diferente. Usando como exemplo a FAZAG, Faculdade Zacarias de Góes, instituição de ensino superior à qual presto serviços, a aula remota acontece via internet, nos mesmos horários que aconteceriam presencialmente. Depois de um princípio difícil, posso afirmar (após entrevistar 114 discentes) que aproximadamente sessenta dias após o início das aulas no novo formato, os alunos já estavam adaptados e satisfeitos com a alternativa aplicada para não pausar seus estudos.

Ouvir o estudante, saber quais são seus anseios, dificuldades, medos e perspectivas, nesse momento, é essencial na avaliação de nosso trabalho. E sem ele, esse texto não se realizaria. 

Entre os dias 04 e 14 do mês de dezembro, aplicamos um questionário para os estudantes da Faculdade. Foram entrevistados trinta e cinco alunos de Administração de Empresas, trinta e um de Contabilidade, dois de Educação Física, onze de Nutrição, dezessete de Enfermagem e dezoito de Fisioterapia. O principal objetivo dessa pesquisa foi avaliar o nível de aprendizagem com aulas remotas. O questionário atingiu, aproximadamente, 88% dos estudantes matriculados nas disciplinas Organização Sistemas e Métodos, Matemática Financeira, Estatística e Bioestatística. 

Logo no início da análise dos dados, os números nos trouxeram alento. Quando perguntados sobre a frequência nas aulas/atividades não presenciais promovidas, 86% dos entrevistados responderam ter frequência semelhante ou até superior àquela apresentada nos encontros presenciais. Contudo há um desafio quanto aos outros 14%, que não acompanham devidamente as aulas.  Os dezesseis alunos que apontaram dificuldade em acompanhar os encontros, citaram os seguintes problemas: falta e/ou instabilidade do acesso à internet (apontados por oito alunos), a dificuldade no uso das plataformas online (citados por outros cinco discentes) e desmotivação, só para citar alguns desses motivos.

A pesquisa demonstra o forte interesse dos discentes da região com a participação das aulas remotas. Vale ressaltar que os alunos da FAZAG residem em diferentes cidades do Baixo Sul que circundam Valença. Mas, também, aponta para um importante elemento de disparidade pedagógica que envolve dados de contexto social e econômico – tão evidentes durante a pandemia e que serão alvo de enfrentamento no retorno às aulas presenciais. 

Voltando a nossa pesquisa, no que diz respeito à avaliação dos estudantes sobre as aulas e atividades remotas promovidas pela faculdade, o nível de satisfação é de aproximadamente 73%. No entanto, em meio aos que demonstram dificuldades com as aulas remotas, há indicativos claros de dificuldades no acesso à internet e utilização de algumas plataformas, principalmente no primeiro semestre, anterior à introdução do ambiente virtual de aprendizagem. 

Deixamos na enquete espaços para que fossem registradas, de forma livre, as dificuldades vivenciadas por cada aluno. Palavras-chave, como ansiedade, medo e depressão tornaram-se relevantes, o que representa um alerta de que a educação deve lançar mão de aparatos psicológicos e de acolhimento emocional dos estudantes no retorno à nova “normalidade” escolar e que os conteúdos devem estar voltados, também, para as capacidades socioafetivas ou socioemocionais, como um amparo aos conteúdos mais tradicionais em cada área de conhecimento e componente curricular. 

No entanto, uma coisa me chamou a atenção. No espaço destinado a apontar os três elementos que mais fazem falta nos encontros presenciais, 95% dos entrevistados apontaram a falta da convivência com os colegas e 85% a falta do contato direto com os professores. Isso demonstra a importância da interação social, dos níveis de mediação, das relações interpessoais de cada sujeito responsável pela educação escolarizada. Se esses aspectos antes eram discutíveis agora são muito mais valorizado por todos os entes envolvidos no processo educacional. 

Como era de se esperar, então, 78% dos alunos entrevistados querem voltar logo às aulas presenciais e justificam, em sua maioria com o argumento de que as orientações presenciais do professor são imprescindíveis. Citando uma aluna de Contabilidade: “Sinto falta do professor presente para sanar as dúvidas individuais de cada aluno no ato da apresentação da disciplina e dos trabalhos em grupos nas salas de aula que facilita a absorção do assunto”.

Em outro ponto de nosso questionário, perguntamos: “como você avalia seu aprendizado nesse ano letivo em relação aos anos anteriores?” Aqui 17% afirmam não ter feito qualquer diferença, 21% asseguram ter aprendido menos, 46% alegam que aprenderam muito menos e 16% afirmam ter aprendido mais esse ano a anos anteriores. Existem justificativas curiosas para aqueles que apontam ter aprendido mais esse ano. Vou repetir aqui uma delas: “nesse ano pude ouvir melhor as aulas, pois os alunos que nada querem, não tiveram como interromper a explicação do professor”. Mas, independente dessa minoria, é bom reforçar que o resultado aponta que 67% não estão contentes com o grau de aprendizado alcançado no ano letivo, como pode ser ilustrado nessa resposta: “... acredito que de 100% do que foi ensinado consegui absorver 40% o que teve de ser complementado pelo estudo individual dos assuntos das aulas pela internet quando a mesma estava funcionando bem”.

Com o objetivo de avaliar a adaptação dos alunos às aulas remotas, foi perguntado se os mesmos consideram ter aprendizado alcançado no segundo semestre superior ao segundo. Em caso positivo, eles deveriam apontar o que lhes proporcionou tal melhoria. Como esperado, 90,3% (103 de 114 alunos entrevistados), afirmaram que sim: o segundo semestre trouxe melhores resultados. As justificativas mais apontadas foram: os professores prepararam melhor suas aulas (com 32 respostas), me sinto mais adaptado ao momento (29 respostas) e a adoção de uma plataforma única para os encontros presenciais (resposta dada por 24 alunos). 

Muitas respostas surpreenderam.  Vi discentes que, mesmo em processo de adaptação, vêm esse período tortuoso como uma alternativa capaz de proporcionar novas e relevantes experiências. Um aluno de Administração que hoje cursa o sexto semestre compartilha uma perspectiva otimista sobre o ensino remoto. “Esse período vai passar e nós ganhamos uma forma nova de reposição de aulas; acredito que, daqui a dois anos, se um professor ficar impossibilitado de comparecer à faculdade, ele poderá passar um conteúdo online de qualidade, pois já sabemos que funciona”.

Já uma aluna de Enfermagem acrescenta que o distanciamento social e a falta de atividades geraram uma expressiva ansiedade nos estudantes, e que o ensino remoto surgiu como uma solução para “não ficar parado”, vindo “no momento certo”, na opinião dela.

Outro aluno, cursando Contabilidade, foi mais comedido, mas também enxerga pontos positivos. Em suas palavras: “Após esses dois semestres, posso dizer que minhas primeiras experiências foram positivas, mas também sei que ainda é cedo para se ter uma opinião formada”, ressalta.

Por fim, quando perguntados sobre a qualidade das aulas online, a nota média dada pelos entrevistados é 8 e, para a qualidade da comunicação entre a professores e alunos, 8,6. As ações implementadas pela FAZAG nesse segundo semestre de 2020 também estreitaram a relação com estes discentes. 49,1% daqueles que participaram da enquete dizem que seu relacionamento com a instituição saiu fortalecido e 43,9% relataram que a proximidade permanece a mesma. Apenas 7% dos pesquisados responderam que o laço com a faculdade se enfraqueceu no período.

Diante de nossa investigação podemos concluir que se as instituições estiverem dispostas a investirem em um ambiente virtual de qualidade, os professores se engajarem ao processo adaptando suas aulas às plataformas digitais, os alunos alcançarão o êxito cobiçado. No entanto um desafio se apresenta no horizonte. A vacinação parece ser uma realidade e já se espera o retorno aos encontros presenciais no próximo semestre. Nesse momento, a tarefa mais importante no eventual retorno às aulas será um diagnóstico cuidadoso das aprendizagens que foram consolidadas nesse período de encontros remotos. 


(*) Osmando Barbosa é mestre em Matemática pela UFBA; Especialista em Metodologia do Ensino da Matemática e da Física e em Mídias Educacionais.  Licenciado em Matemática e Bacharel em Economia. Professor da rede estadual de ensino e da FAZAG – Faculdade Zacarias de Góes.